quinta-feira, 20 de maio de 2010

A primeira vez a gente nunca esquece

Um texto que fiz recentemente no qual conto como foi a experiência da minha primeira redacao:


A primeira vez a gente nunca esquece

por Thiago Fuzihara Crepaldi

Meu batismo com a língua portuguesa se deu quando eu estava no segundo ano do Ensino Médio do Colégio Palmares. Era um garoto como outro qualquer, que vivia lá os seus dezesseis anos. Ou seja: achava que tudo o que saía da boca dos meus pais era piegas ou careta; que, mesmo sendo menor de idade, já tinha autonomia e resistência para poder beber como um sujeito maior de idade; que sabia como ninguém seduzir as pessoas do sexo oposto;e que minhas ideias eram capazes de revolucionar o mundo.

Redações já havia feito uma penca delas, mas todas sempre naquela linha “minhas férias...". Acontece que a professora de língua portuguesa daquele segundo ano era uma professora diferente - uma baita professora. Éramos inundados por textos filosóficos, literários, existenciais (ou mesmo os três ao mesmo tempo: filosófico-literário-existencial), humanos, enfim, e posteriormente forçados ou, melhor, estimulados a refletir em grupo sobre as questões que aqueles belos textos suscitavam. Foi o meu primeiro contanto com o desespero da condição humana, através de Saramago. Depois de uma dessas acaloradas discussões fiquei com um pensamento fixo matutando na cabeça e fui viajar para o meu sítio, como de costume, com o dever de entregar uma redação na aula da semana seguinte.

Naquele final de semana foi a primeira vez que eu realmente sentei com o propósito de escrever alguma coisa decente. Fiquei horas para esboçar um ponto de vista claro, seguido de eixo-argumentativo e uma conclusão, como preconizou a professora. Não obstante a demora, a redação saiu. Com o pueril título: “Ciência vs Literatura”. Basicamente, o que tentei sustentar era que a ciência não era eterna porque era, antes, temporal; e que a literatura o era porque era atemporal, transcendia a linearidade dos séculos.

Na aula seguinte a da entrega, a professora separou três redações para ler em sala, a minha dentre elas. Julia, a magnífica professora de quem sempre guardarei lembranças, elogiou bastante o potencial temático-reflexivo de minha redação. Com todo o seu repertório ela afirmou que eu, mesmo sem saber, havia definido a dualidade do homem. E, para meu orgulho e espanto, citou um trabalho de Edgar Morin, eminente pensador contemporâneo, exatamente sobre essa tal dualidade humana: “Sapiens Demens”. Desde então, o garoto, que achava que tudo podia dentro da sua alienada bolha adolescente, tomou gosto pela coisa. E, vez ou outra, aventura-se na especulação do universo.

Conheça o cara:
Conferência "Pensar o Sul", no SESC, quando veio ao Brasil.

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